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Além da ZFM: conheça três zonas francas estratégicas para a economia de seus países

Colón e Dubai aparecem entre os grandes polos globais, enquanto Ciudad del Este surge como aposta logística na América do Sul

Foto: Divulgação

As zonas francas são áreas criadas para facilitar o comércio e atrair empresas por meio de benefícios fiscais. Segundo o consultor Osmar Perazzo Junior, doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas, essas regiões funcionam como espaços delimitados onde produtos podem entrar, ser armazenados, distribuídos ou reexportados sem a cobrança imediata de impostos.

“As zonas econômicas especiais oferecem aos investidores três vantagens principais: um regime aduaneiro especial, com acesso a insumos importados, entre bens básicos, intermediários e, em muitos casos, de capital, livres de tributação; uma infraestrutura mais confiável que a do restante do país; e os incentivos fiscais, compreendendo a isenção e redução de impostos”, destaca o especialista em sua obra “Zonas de Livre Comércio no Mundo”. “[Elas] oferecem instalações para estocagem, armazenamento e distribuição para operações de comércio, transbordo e reexportação”, completa.

Na prática, a zona franca permite que empresas mantenham mercadorias com custo reduzido, o que estimula a instalação de indústrias, movimenta a economia e gera empregos, especialmente em regiões distantes dos grandes centros. No Brasil, esse modelo aparece em diferentes formatos, como a Zona Franca de Manaus, as Áreas de Livre Comércio instaladas na Amazônia e as Zonas de Processamento de Exportação.

Nesta matéria, a PIM Amazônia te convida a imergir em um panorama internacional, para entender como o modelo evoluiu até se tornar peça-chave do comércio global. Somado a isso, são apresentados três exemplos emblemáticos de zonas livres no mundo.

Retrospecto

Os registros históricos apontam que a ideia de um território com regras comerciais diferenciadas é extremamente antiga. Segundo artigo da Associação Brasileira de Zonas de Processamento de Exportação (Abrazpe), um dos primeiros exemplos conhecidos surgiu em 166 a.C., quando a Grécia estabeleceu, na ilha de Delos, um porto livre, considerado a primeira Zona Franca de Comércio de que se tem notícia.

Além da ZFM: conheça três zonas francas que moldam a economia de seus países

Séculos depois, o Império Romano retomaria essa lógica ao criar as chamadas Civitates Liberae, cidades que não precisavam pagar o tributo anual ao imperador e que ainda tinham autonomia para cunhar moedas e definir suas próprias normas.

Muito mais tarde, já na Idade Média, o conceito ganhou força com a Liga Hanseática, rede de cidades mercantis sob influência do Sacro Império Romano-Germânico, que explorava modelos semelhantes por meio de colônias comerciais instaladas no norte europeu; Hamburgo figura entre as mais emblemáticas.

Ainda assim, o exemplo que mais se aproxima das Zonas Francas modernas surgiu em Londres: o Steelyard, um enclave murado às margens do rio, dotado de armazéns, serviços próprios, igreja, balança comercial e até áreas residenciais, uma espécie de “cidade dentro da cidade”.

Na transição para a era contemporânea, a lógica das zonas com regime especial se consolidou com os entrepostos coloniais europeus. Macau (1557), Hong Kong (1842) e diversos territórios na China, que chegou a contar com mais de 80 portos francos ou tratados portuários, funcionaram como subgovernos quase soberanos, operando com prerrogativas comerciais próprias. Hoje, estima-se que existam aproximadamente quatro mil Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) espalhadas pelo planeta.

Embora os Estados Unidos frequentemente sejam citados como pioneiros das Zonas de Comércio Exterior por terem instituído seu programa de ZCEs em 1934, a maior parte dos especialistas reconhece que o marco da fase moderna das ZEEs foi a criação da Zona de Comércio Exterior de Shannon, na Irlanda, em 1959.

A experiência irlandesa abriu caminho para uma série de iniciativas semelhantes: a ZCE de Kandla, na Índia, surgida em 1960; a Zona de Processamento de Exportação de Kaohsiung, em Taiwan, fundada em 1967; e o movimento de expansão em massa das ZCEs na China, que passou de nenhuma área especial em 1980 para cerca de 300 atualmente.

Panamá detém a maior Zona Franca das Américas

A Zona Livre de Colón (ZLC), no Panamá, é o principal centro de reexportação das Américas e permanece reconhecida como a maior zona franca do continente. Está localizada na entrada atlântica do Canal do Panamá e funciona como um complexo autônomo voltado para armazenamento, distribuição e comércio internacional.

Atualmente, a ZLC é organizada em nove setores que somam aproximadamente 1.064 hectares e abrigam mais de 1.800 empresas usuárias e representadas números que traduzem sua escala logística e comercial na região. No seu início, eram apenas 10 empresas em uma área segregada de 35 hectares.

Além da ZFM: conheça três zonas francas que moldam a economia de seus países

Em 2024, de acordo com o jornal La Estrella, a zona panamenha registrou cerca de US$ 24,933 bilhões em operações (importações+reexportações) e, no primeiro semestre de 2025, já havia registrado US$ 11,324 bilhões até junho, com projeção de crescimento para o fechamento deste ano. Entre 2024 e 2025, 241 novas empresas ingressaram na área.

A ZLC opera basicamente como um centro de reexportação: produtos chegam ao complexo, vindos de Ásia, Estados Unidos, Europa e outros centros, são armazenados, consolidados e redistribuídos para mercados da América Latina e Caribe. Historicamente, países como Colômbia, Venezuela e Guatemala foram grandes destinos das mercadorias. Esse papel fez da ZLC um elemento estrutural da balança comercial panamenha e gerador de 14 mil empregos, segundo o veículo de imprensa local Hub News.

A Zona Livre de Colón funciona como uma entidade autônoma administrada por ZOLICOL, entidade pública responsável por gerir, regular e fiscalizar seu funcionamento, incluindo autorizações, contratos, políticas operacionais e infraestrutura. Desde sua criação por decreto em 1948, a legislação foi atualizada, entre as reformas mais importantes está o Decreto-Lei nº 8 de 2016, para ampliar atividades permitidas (incluindo e-commerce, operação portuária e centros logísticos) e modernizar o marco regulatório.

Além da ZFM: conheça três zonas francas que moldam a economia de seus países.

Relatórios internacionais e organismos multilaterais já ressaltaram que as reexportações da ZLC representam parcela relevante do desempenho externo do Panamá; em alguns anos esse fluxo chegou a compensar déficits em outros setores, destacando o peso da ZLC na conta externa.

Ao mesmo tempo, a atividade da zona é sensível a choques regionais: variações na demanda dos países compradores, barreiras comerciais locais e crises de pagamento em parceiros (como episódios passados com a Venezuela) podem reduzir ritmo de reexportações.

A ZLC combina armazéns, zonas alfandegadas, áreas portuárias e acesso privilegiado ao Canal do Panamá, arquitetura que favorece operações just-in-time e consolidação de cargas. Nos últimos anos houve anúncios de expansão e investimentos em centros logísticos, a exemplo de novos projetos de hubs e centros de distribuição, além de esforços para atrair empresas de e-commerce e operadores de logística moderna.

Zona Franca Industrial de Dubai

A Jebel Ali Free Zone (JAFZA), operada pela DP World e localizada ao lado do porto de Jebel Ali em Dubai, é uma das mais importantes zonas francas industriais globais. Fundada em 1985, começou com apenas 19 empresas e hoje abriga mais de 10.700 empresas de mais de 150 países, incluindo mais de 100 companhias da Fortune Global 500.

O território da zona franca emiradense cobre cerca de 57 km², oferecendo uma estrutura que integra logística multimodal, por mar (porto de Jebel Ali), terra e ar (Al Maktoum Airport), o que facilita a cadeia de suprimentos para indústrias.

No ano fiscal recente, JAFZA registrou volumes de comércio recordes, com US$ 190 bilhões em transações comerciais, segundo a DP World, fortalecendo sua posição como núcleo industrial estratégico de Dubai.

Em 2024, a zona atraiu 990 novas empresas, totalizando cerca de 10.850 companhias no fim do ano, demonstração clara de seu apelo para investidores globais. A JAFZA gera mais de 160 mil postos de trabalho dentro da zona, entre diretos e indiretos.

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No aspecto industrial, a zona concentra um ecossistema diversificado: fabricantes de equipamentos, tecnologia, alimentos, saúde, automotivo e produtos de consumo utilizam a estrutura oferecida.

Do ponto de vista estratégico, JAFZA é um dos maiores geradores de Investimento Estrangeiro Direto (FDI) para Dubai. De acordo com a própria zona, ela representa uma parcela significativa dos fluxos de investimento estrangeiro em transporte, comércio e manufatura.

Em sustentabilidade, a JAFZA tem metas ambiciosas: pretende atingir neutralidade de carbono até 2040 e emissões líquidas zero até 2050. Já instalou 158.000 painéis solares em seus galpões, o que ajuda a reduzir emissões e energia convencional.

Sua receita operacional vem majoritariamente da locação de terrenos e galpões; em 2024, cerca de 87% da receita era proveniente desse tipo de contrato, conforme apontam documentos da DP World.

Zona Franca Global do Paraguai

A Zona Franca Global (ZFG) de Ciudad del Este é uma das duas zonas francas operando no Paraguai sob o regime legal da Lei 523/95. Localizada em um terreno de aproximadamente 40 hectares, no “Complejo Empresarial Global”, ela abriga cerca de 40 empresas dos mais variados setores, industriais, comerciais e de serviços. A ZFG emprega cerca de 3 mil pessoas.

No aspecto regulatório e tributário, a ZFG opera sob concessão de 30 anos, renovável conforme a legislação vigente. Segundo a revista Corporativa Global, as empresas que atuam na zona se beneficiam de isenções fiscais como a importação de insumos sem tributação nacional, além de isenção de IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) e exclusão de tributos sobre repatriação de lucros, royalties, juros, comissões ou remuneração por serviços e tecnologia vindos do exterior. Para compensar, há um imposto único de 0,5% sobre a receita bruta de exportações ou vendas dentro da zona, segundo o regulamento local.

Em termos de infraestrutura, a Zona Franca Global conta com uma subestação de energia própria para atender suas indústrias, além de aduana integrada, centro de treinamento ligado ao Serviço Nacional de Promoção Profissional (SNPP) e apoio da União Industrial Paraguaya (UIP). Essa estrutura permite operações de produção, armazenamento, distribuição e logística com bastante eficiência.

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Economicamente, a ZFG tem papel relevante para o Paraguai, especialmente por permitir a montagem e exportação de produtos a partir do país, atraindo empresas estrangeiras e gerando emprego local. Há também articulação internacional: a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) reforçou parceria com a ZFG para integração logística e cooperação bilateral.

A Autarquia brasileira tem sinalizado que a zona paraguaia pode vir a funcionar como centro de distribuição estratégico para os produtos do Polo Industrial de Manaus (PIM). Esse potencial vem de um Memorando de Entendimento entre a ZFM (Manaus) e a ZFG, renovado em 2025, que prevê estudos de alternativas logísticas para viabilizar rotas de exportação e armazenagem.

Durante a missão institucional e comercial da ZFG a Manaus, em maio de 2025, representantes paraguaio-brasileiros visitaram empresas do PIM e operadores logísticos, além de discutirem a possibilidade de um voo cargueiro direto entre Manaus e Ciudad del Este, algo que pode reduzir barreiras logísticas e tornar mais competitivo o escoamento de mercadorias.

Segundo o coordenador de Comércio Exterior da Suframa, Arthur Lisboa, usar a ZFG como hub poderia facilitar a entrada de produtos de Manaus em mercados da América do Sul.

Fotos: Divulgação

 

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